“Amor Amargo” e o ciclo do relacionamento abusivo

Créditos: Literatura Estrangeira



Olá!

Hoje o post é sobre uma das leituras mais difíceis que fiz nessa vida de bookstan, já fazem dois anos, mas ainda me lembro dos incômodos gerados pelas palavras da autora. Eu não lembro como, nem quando eu descobri que "Amor Amargo" existia, mas ao dar uma breve lida na sinopse acabei me interessando. São poucos livros que já me deixaram tão brava e tão enjoada ao mesmo tempo, acredito que tenha consumido a estória em um dia.

Nunca estive em um relacionamento abusivo e durante muito tempo foi difícil para eu entender porque as pessoas continuavam em relacionamentos que as destruíam, não só fisicamente, como psicologicamente. É claro que existem inúmeros motivos que levam alguém a acreditar que talvez seu relacionamento não esteja tão ruim, ou que a pessoa em questão só faz o que faz por amar demais. No caso de nossa protagonista Alex, a solidão que ela sentia após a morte inexplicável da mãe, foi um dos fatores que a levou a agarrar com todas as forças o que havia sido construído com Cole. O pai estava presente, mas só de corpo, as irmãs de Alex não se importavam o suficiente, a garota nunca sequer tinha ouvido um “eu te amo” vindo dessas partes. Quando Cole apareceu, todo gentil, cavalheiro e interessado, Alex achou que tinha encontrado sua alma gêmea.

Claro que ele não ia demonstrar logo de cara que era alguém que pudesse parecer assustador, acho que ninguém assim demonstra, os sinais são bastante sutis. No final do livro (pelo menos a versão digital que li) tem uma seção de perguntas e respostas dando informações bastante valiosas a respeito do tema, por exemplo, como identificar um agressor. A questão é, a maioria das vítimas percebe quando é tarde demais, e quando percebem,  se sentem culpadas pelo que acontece e acham que talvez se comportando de uma maneira diferente, as agressões param, como foi o caso de Alex. Cole tinha ciúmes de Bethany e Zach, então ela achou que cortando relações com eles tudo seria resolvido, mas não é assim, nunca é.

Jennifer Brown, a autora do livro, é graduada em Psicologia (assim como eu), e bem no finalzinho ela conta como se interessou pelo assunto e quis escrever sobre isso.

“(…) Inúmeras vezes ouvi a mim mesma dizendo coisas como: “Jamais permitiria que alguém abusasse de mim. Agrida-me uma única vez e eu caio fora!”. Na verdade, ouvi várias mulheres dizerem coisas parecidas. “Se algum dia um cara me agredir…”, costumamos dizer, e, em seguida, completamos a frase com uma porção de fortes e veementes ameaças. Às vezes, ficava me perguntando quantas mulheres, que continuaram reféns de um relacionamento abusivo por não terem a menor ideia de para onde ir ou do que fazer, tinham um dia dito: “Jamais permitiria...” ou “Se algum dia um cara me agredir…” Então, passei o semestre inteiro aprendendo sobre o ciclo da violência. Aprendi sobre suas três diferentes fases: a fase da evolução da tensão, a fase do incidente de agressão e a fase do comportamento gentil e amoroso, também chamada de fase “lua de mel”. Aprendi tudo sobre a sensação de impotência e a síndrome da mulher maltratada. Sabia tudo de cor e salteado. Sabia exatamente o que se passava na cabeça de uma mulher que não conseguia romper com o homem que a agredia. Mas, e o que se passava no seu coração? Onde estava o coração naqueles livros de psicologia? Afinal de contas, na maioria das vezes, não mergulhamos em relacionamentos amorosos por motivos puramente racionais. Da mesma forma, na maioria das vezes, também não é por motivos racionais que permanecemos neles. Amamos e, por amarmos, a coisa pode se tornar muito mais complicada do que uma simples questão de “permitir” (…)”

Eu não poderia concordar mais.

Sobre isso, nem sempre as agressões serão físicas, mas pode ser que ele(a) queira manter o controle o tempo todo, fazer sua/seu parceiro se sentir culpada(o) por toda discussão que tiverem, xingar, diminuir na frente dos outros, desmotivar e depois de tudo vai agir como se nada tivesse acontecido, ou vai prometer mudar ou se justificar dizendo que é porque ama demais e tem medo da perda. Nós, principalmente mulheres, tendemos a acreditar que alguém pode mudar só porque, supostamente, nos ama, que devemos insistir porque jamais encontraremos alguém que nos entenda tão perfeitamente quanto determinada pessoa, e que ele (a) nunca mais vai fazer nada daquilo porque te prometeu que mudaria, mas não, as agressões não param e você começa a viver com um medo constante de até falar alguma coisa que o (a) provoque. 

Em Amor Amargo, Cole começa a dar pequenos sinais, enquanto Alex ignora. Até que as agressões começam e o ciclo tensão-agressão-arrependimento-promessas de mudança, se torna cada vez mais frequente e grave. E eles são apenas adolescentes.

O que eu quero dizer é que o mundo tem bilhões de pessoas e uma ou várias delas vão te fazer feliz, você não precisa pagar um preço pelo “amor incondicional” de alguém. Desconfie de quando tudo é demais, presentes demais, atenção demais, ciúmes demais, críticas demais, como diz aquele ditado “tudo que é demais faz mal”. Não estou dizendo que as pessoas não possam ser gentis, muito pelo contrário, mas se essas gentilezas só vêm depois que te fizeram se sentir um lixo, então sim, tem alguma coisa errada aí.

Aos amigos das vítimas que perceberam o que está acontecendo, tenham PACIÊNCIA. Talvez você ache que depois de um tempo não vale mais a pena conversar, que é melhor cortar amizade logo. Eu também pensei assim. Mas sério, se vocês desconfiam e estão vendo que a pessoa não vai conseguir se livrar daquilo sozinha, contem para alguém ou para todo mundo que se importa. Alerte os pais, responsáveis ou pessoas próximas, procure a polícia se presenciar agressões. Faça de tudo, porque mesmo a vítima dizendo que tem tudo sob controle, ela se tornou dependente e vai ter dificuldades de enxergar tudo que está acontecendo por mais absurdo que pareça para os outros.

Recapitulando, não é amor e não é saudável quando você é obrigada (o) a se afastar dos seus amigos, quando é xingada (o), quando é diminuída (o), quando qualquer coisa que você fale é motivo para ataques, quando você não pode mais se arrumar, quando você é obrigada (o) a ter relações sexuais, quando te fazem sentir culpada (o) o tempo todo, quando te batem, beliscam, sacodem, gritam na sua cara. Procure ajuda, não se preocupe com julgamentos dos outros, apenas se liberte antes que seja tarde. Importante ressaltar também, que os relacionamentos abusivos não se tratam apenas de namoros ou casamentos heterossexuais, acontecem também entre relacionamentos homossexuais, entre amigos, pais e filhos, irmãos, assim como homens podem ser vítimas de mulheres abusivas, mesmo que isso aconteça com bem menos frequência.

Recomendo demais a leitura do livro a quem se interesse pelo assunto, Jennifer retrata de um jeito muito verdadeiro como relacionamentos abusivos acontecem, e sem romantizar em nenhum momento. Apesar de não ser um enredo fácil de digerir, é bastante necessário.

Por último, queria lembrar que Agosto é o mês de combate a violência doméstica e domiciliar contra a mulher, disque 180 se presenciar qualquer tipo de violência física, sexual, psicológica, moral e patrimonial.

E você, já passou por algo parecido ou conhece alguém? Conta aqui nos comentários, espero que tenha ajudado de alguma forma.


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Beijos, Raíssa!


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